sexta-feira, 7 de novembro de 2008


Recordação (Cecília Meireles)

Agora, o cheiro áspero das flores
Leva-me os olhos por dentro de suas pétalas.

Eram assim teus cabelos;
Tuas pestanas eram assim, finas e curvas.

As pedras limosas, por onde a tarde ia aderindo,
Tinham a mesma exalação de água secreta,
De talos molhados, de pólen,
De sepulcro e de ressurreição.

E as borboletas sem voz
Dançavam assim veludosamente.

Restitui-te na minha memória, por dentro das flores!
Deixa virem teus olhos, como besouros de ônix,
Tua boca de malmequer orvalhado,
E aquelas tuas mãos dos inconsoláveis mistérios,
Com suas estrelas e cruzes,
E muitas coisas tão estranhamente escritas
Nas suas nervuras nítidas de folha,
-- E INCOMPREENSÍVEIS, INCOMPREENSÍVEIS.